Introdução
A Lei Estadual 22.474/2023 de Goiás visa regular o setor de compartilhamento de infraestruturas, mas, na verdade cria enormes prejuízos para o Setor de Telecomunicações.
A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendendo a eficácia da Lei 22.474/2023 do Estado de Goiás, que versa sobre o compartilhamento de infraestrutura de telecomunicações e energia elétrica, trouxe à tona importantes questões constitucionais sobre a competência legislativa dos entes federativos.
A referida legislação é praticamente uma cópia das Resoluções Anatel/Aneel que já disciplinam o assunto dentro da complexidade regulatória existente. No entanto, apesar da cópia diante das Resoluções Setoriais, a Lei Estadual criou aberrações jurídicas que precisam ser combatidas.
No art. 3º, da Lei 22.474/2023, o Estado de Goiás estabeleceu um teto para o preço a ser pago pelo compartilhamento, cujo valor não pode ser superior a R$ 10,00 (dez reais). Mesmo que a primeira vista esse limitador possa parecer um benefício, o que não é, tal estipulação é completamente inconstitucional. Além disso, tal teto traz um risco enorme para as empresas de telecomunicações, eis que as Cias de Energia poderiam estabelecer tal preço de R$10,00 como sendo o preço justo e razoável para o compartilhamento. Sendo que, lado outro, atualmente, o preço de referência (Res. 004/2014) atualizado pelo IPCA, até novembro de 2024 (último índice até então disponível), corresponde a R$5,59.
E além do exposto, no parágrafo único do art. 3º, da referida Lei, o Estado de GO estabeleceu que o Poder Público Municipal pode cobrar uma compensação financeira pela manutenção do serviço de iluminação pública em face dos Agentes envolvidos (Leia-se: Empresas de Telecomunicações e Cias de Energia Elétrica).
Este artigo busca analisar os aspectos jurídicos da decisão proferida pelo STF e suas implicações, com ênfase na distinção crucial entre os setores afetados. Além de ressaltar a total inconstitucionalidade da lei goiana, e os perigos de mantença da referida lei para o setor de telecomunicações.
A Lei 22.474/2023 e a Usurpação de Competência
A Lei 22.474/2023 do Estado de Goiás, ao legislar sobre o compartilhamento de infraestrutura de telecomunicações e energia elétrica, adentrou em matéria de competência privativa da União, conforme estabelecido no artigo 22, inciso IV da Constituição Federal. Esta ação legislativa estadual configura uma clara usurpação da competência federal, tornando a lei manifestamente inconstitucional em ambos os setores (telecomunicações e energia elétrica).
O Veto do Governador e a Posição do Executivo Estadual
É importante ressaltar que o próprio Governador do Estado de Goiás reconheceu a inconstitucionalidade da lei, vetando-a integralmente:
“A Procuradoria-Geral do Estado – PGE, no Despacho no 1.637/2023/GAB (SEI no 52200852), sugeriu o veto total ao autógrafo por vício formal orgânico. Apontou-se que prepondera na proposta matéria relativa à prestação de serviços públicos de distribuição de energia elétrica e de telecomunicações, cuja competência para legislar é privativa da União, conforme o inciso IV do art. 22 da Constituição federal. Foi informado que a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL e a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL já editaram normas regulatórias suficientes a respeito do tema. A sugestão de veto é corroborada pelo Supremo Tribunal Federal – STF no julgamento de inconstitucionalidade de leis estaduais semelhantes, como na Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI no 7.255. A PGE acrescentou que o Estado não tem competência para autorizar que os municípios cobrem pelo compartilhamento da infraestrutura municipal, nos termos do parágrafo único do art. 3º proposto.”.
Este ato demonstra a consciência do Executivo Estadual quanto aos limites constitucionais de sua competência legislativa, reforçando a tese de inconstitucionalidade da norma estadual questionada.
A Questão da Cobrança Municipal
Um ponto crucial da lei suspensa era a autorização para que municípios cobrassem uma contraprestação pela manutenção dos serviços de iluminação pública. Esta disposição não apenas extrapola a competência estadual, mas também viola princípios constitucionais relativos à autonomia municipal e à organização dos serviços públicos.
A Decisão do STF e a Medida Cautelar: Efeitos Limitados ao Setor Elétrico
Analisando a decisão proferida pelo STF, observa-se que a Corte Suprema, em resposta à ADI 7722 movida pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (ABRADEE), concedeu uma medida cautelar para suspender os efeitos da Lei 22.474/2023 apenas no que se refere ao setor de energia elétrica. Esta decisão, tomada por unanimidade, demonstra o entendimento pacífico do STF quanto à inconstitucionalidade da norma no âmbito do setor elétrico.
É crucial ressaltar que a decisão não produz efeitos para as empresas de telecomunicações. Estas empresas deverão questionar a referida legislação separadamente para obter a suspensão dos efeitos em seu setor.
O Ministro Alexandre de Moraes do STF, relator do caso, fundamentou sua decisão na clara violação das competências administrativas e legislativas da União diante do setor elétrico. O Ministro ressaltou que a lei goiana fixou “balizas regulatórias para a concessão de energia elétrica que detêm o nítido potencial de conflitar com o regramento previsto em âmbito federal.”.
Implicações da Decisão: Foco no Setor de Telecomunicações
A suspensão da Lei 22.474/2023 pelo STF, limitada apenas ao setor de energia elétrica, tem implicações significativas, especialmente para o setor de telecomunicações:
Estas implicações destacam a complexidade da situação criada pela decisão do STF e sublinham a necessidade urgente de uma resolução que abranja também o setor de telecomunicações, para garantir um ambiente regulatório equilibrado e juridicamente seguro para ambos os setores.
Conclusão
A decisão do STF ao suspender a Lei 22.474/2023 do Estado de Goiás reforça o entendimento constitucional sobre a divisão de competências legislativas no sistema federativo brasileiro, especificamente no setor de energia elétrica. No entanto, a limitação dessa decisão ao setor elétrico cria uma situação complexa para o setor de telecomunicações.
Esta decisão não apenas protege a integridade do sistema regulatório nacional de energia elétrica, mas também destaca a necessidade de ações similares no setor de telecomunicações. A disparidade criada entre os dois setores ressalta a importância de uma abordagem uniforme em questões de competência legislativa, especialmente em áreas tão intrinsecamente ligadas como energia e telecomunicações.
As empresas de telecomunicações agora enfrentam o desafio de buscar judicialmente a mesma proteção concedida ao setor elétrico, o que pode levar a uma série de litígios e incertezas regulatórias no curto prazo. Esta situação sublinha a necessidade de uma revisão mais ampla e sistemática das leis estaduais que possam infringir competências federais em setores estratégicos da infraestrutura nacional.
Thiago da Silva Chaves
Advogado e Consultor Jurídico
Sócio da Silva Vitor, Faria & Ribeiro – Sociedade de Advogados
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