Por meio de Arguição de Inconstitucionalidade Formal aplicada no julgamento do Processo nº 0034479-25.2015.8.07.0001, no dia 11 de abril de 2023 o Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) declarou a inconstitucionalidade do art. 46 da Resolução Anatel nº 632/2014 (Regulamento Geral do Consumidor – RGC), que obrigava as prestadoras dos serviços de telecomunicações a estender todas as ofertas, inclusive, as ofertas em caráter promocional, a todos os interessados, incluindo os que já eram clientes das prestadoras.
Vejamos o que disciplinava o referido artigo 46 do RGC:
“Art. 46. Todas as ofertas, inclusive de caráter promocional, devem estar disponíveis para contratação por todos os interessados, inclusive já Consumidores da Prestadora, sem distinção fundada na data de adesão ou qualquer outra forma de discriminação dentro da área geográfica da oferta.”
Os 20 (vinte) Desembargadores do TJDJ que participaram do julgamento estendido entenderam que tal regra prevista no art. 46 do RGC, criado pela Anatel, extrapolava os limites do poder regulamentador da Agência Regulatória, conforme previsto na Lei Geral de Telecomunicações – Lei Federal nº 9.472/1997.
O Tribunal do DF apontou no mencionado julgamento que ao criar o referido art. 46 do RGC a ANATEL legislou em matéria de telecomunicações e não apenas regulamentou, sendo que diante do que versa a Constituição Federal de 1988 apenas a União, por meio do poder legislativo, possui competência privativa para criar leis sobre matéria de telecomunicações.
O poder regulamentador da Anatel não pode ser confundido com o poder legislador!
Além disso, os Magistrados do TJDF também compreenderam que o referido artigo 46 do RGC feriu os princípios constitucionais da livre iniciativa e liberdade econômica, porque se tornou um obstáculo para as prestadoras dos serviços de telecomunicações criarem ofertas e promoções para conquistar novos clientes. Logo, as prestadoras dos serviços de telecomunicações, diante da referida norma, teriam que revisar e adequar automaticamente todos os contratos já existentes (em vigor) para cumprir o disposto pela Anatel.
Para ilustrar o efeito da norma considerada inconstitucional pelo TJDF, se um determinado cliente contratou um serviço de telefonia (por exemplo), por um preço fixado e, futuramente, a mesma prestadora ofertou esse mesmo serviço com uma condição mais vantajosa para angariar novos clientes de uma determinada localidade, o contrato daquele cliente automaticamente deveria se adequar ao novo parâmetro criado para angariar novos cliente, mesmo que aquele cliente (já contratante) não faça a solicitação.
É muito comum as prestadoras de telecomunicações realizarem promoções para localidades mais afastadas dos grandes centros urbanos ou para locais onde a prestadora deseja melhorar a sua capilaridade, devendo sempre ser levado em consideração as particulares da composição de preços e o momento quando ocorre a precificação. No entanto, a redação do art. 46 do RGC deixava as prestadoras de telecomunicações completamente amordaças quanto a liberdade de conduzir as estratégias comerciais e o plano de negócios, ferindo notoriamente a livre iniciativa e a liberdade econômica da atividade privada.
Na visão do Desembargador Alfeu Machado do TJDF, relator do processo acima mencionado, o artigo 46 do RGC, considerado inconstitucional, gerava um cenário de caos para as empresas do ramo de telecomunicações, uma vez que criava insegurança econômica/jurídica e blindava o crescimento das empresas, também inviabilizando que tais empresas pudessem buscar estratégias para conquistar novos clientes.
Logo, nesse sentido, sem sombras de dúvidas, a referida norma (art. 46 do RGC) interferia no desenvolvimento e crescimento econômico do país.
A brilhante decisão proferida pelo TJDF concluiu que a livre negociação por si só não fere os direitos do consumidor, já que as normas jurídicas que defendem o consumidor no ordenamento pátrio dispõem que o consumidor e o fornecedor estão obrigados a cumprir o que foi espontaneamente acordado entre as partes no bojo do contrato, devendo ser respeitando o período de vigência do pacto contratual.
A decisão proferida em sede de Arguição de Inconstitucionalidade Formal possui efeitos erga omnes, ou seja, a decisão proferida na referida ação judicial beneficia todas as empresas de telecomunicações.
Por Dr. Daniel Rabello
Advogado e Consultor da Silva Vitor, Faria & Ribeiro – Sociedade de Advogados