O advento do Novo Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (Novo RGC), instituído pela Resolução Anatel nº 765/2023, promoveu uma profunda reformulação dos contratos que regem a prestação dos serviços de telecomunicações ao consumidor.
Embora sua vigência plena tenha se iniciado em 1º de setembro de 2025, diversas disposições já se encontravam em vigor, nos termos do parágrafo único do art. 84 e dos arts. 93 a 96 do regulamento, exigindo desde então adequações por parte das Prestadoras de serviços de telecomunicações.
A seguir, destacam-se os principais impactos do Novo RGC nos contratos e na relação com o consumidor de telecomunicações.
Oferta como eixo central do contrato
(arts. 21, 22, 28, 40, I, 55)
Uma das principais inovações do Novo RGC é a centralidade conferida ao conceito de Oferta, entendida como a proposta comercial apresentada pela Prestadora ao consumidor. A Oferta passa a ser o eixo estruturante da relação contratual, reunindo as informações essenciais do serviço contratado.
A Oferta deve contemplar, entre outros elementos: os serviços prestados (como internet, telefonia, TV por assinatura e/ou serviços de valor adicionado), os valores cobrados, as condições de uso (franquias, limites, eventual fidelização), os benefícios concedidos e os canais de atendimento disponíveis.
Nos termos do regulamento, a Oferta deve conter, no mínimo: (i) nome comercial da Oferta; (ii) Prazo de Vigência; (iii) preços e tarifas aplicáveis, critério de tarifação e forma de pagamento; (iv) critérios e data-base de reajuste, que não poderá ser inferior a 12 (doze) meses, observado o disposto no art. 39.
Cada Oferta deve possuir código de identificação único, que deve constar do contrato e dos documentos de cobrança.
Além disso, a Prestadora deve manter um repositório permanente de Ofertas em sua página na internet, pelo período de 3 (três) anos após o fim de sua vigência, com disponibilização da Etiqueta Padrão.
Etiqueta Padrão
(arts. 22 e 42)
O Novo RGC instituiu a Etiqueta Padrão, documento obrigatório que apresenta, de forma resumida e padronizada, as principais informações da Oferta. Seu objetivo é facilitar a compreensão das condições contratuais e permitir a comparação entre diferentes planos.
A Etiqueta Padrão deve conter, entre outras informações: (i) nome comercial do plano; (ii) código de identificação da Oferta; (iii) tipo de serviço (móvel, fixo, banda larga, TV por assinatura); (iv) preço, franquia, velocidade e área de cobertura; (v) condições de uso e de contratação.
Deverá ainda apresentar um resumo da contratação, incluindo: (i) existência e prazo de fidelização (se aplicável); (ii) serviços adicionais incluídos; (iii) regras de reajuste; (iv) canais de atendimento e de ouvidoria.
O modelo da Etiqueta Padrão é definido e disponibilizado pela própria Agência Nacional de Telecomunicações em seu sítio eletrônico.
Prazos de Comercialização x Permanência x Vigência
(art. 3º)
- Prazo de Comercialização: Período em que a Prestadora disponibiliza uma Oferta para contratação.
- Prazo de Permanência: Condição da Oferta que vincula o consumidor por um período mínimo, em contrapartida a benefício concedido, substituindo e refinando o antigo “Contrato de Permanência”.
- Prazo de Vigência: Período durante o qual a Oferta produzirá seus efeitos a partir da contratação pelo consumidor.
Opção Sem Permanência e Contrato de Permanência em documento apartado
(art. 38)
O Novo RGC assegura ao consumidor o direito de contratar a Oferta sem vínculo de permanência, reforçando a liberdade de escolha e a transparência na relação contratual.
De toda forma, o Novo RGC dispensou a exigência do Contrato de Permanência, em documento apartado, para fins de formalização da concessão de benefícios pela Prestadora ao consumidor, em contrapartida a fidelização contratual. As condições de permanência passam a integrar a própria Oferta e o contrato principal.
Fidelização e multa contratual
(arts. 36, 37 e 38)
A multa por rescisão antecipada da Oferta deve observar os seguintes critérios: (i) proporcionalidade em relação ao tempo restante do Prazo de Permanência; (ii) limitação ao valor do benefício efetivamente concedido ao consumidor.
O contrato deve discriminar de forma clara: (i) o benefício concedido e seu valor; (ii) a forma de cálculo da multa; (iii) o período predeterminado de permanência
Suspensão e rescisão contratual
(arts. 70 e seguintes)
As regras relativas à suspensão e à rescisão contratual foram ajustadas para conferir maior previsibilidade e proteção ao consumidor.
(i) Suspensão por inadimplência: após 15 (quinze) dias de notificação de débito, poderá ocorrer a suspensão integral do serviço pela Prestadora. Inexistindo a necessidade de suspensão parcial dos serviços pela Prestadora, para posterior suspensão total.
(ii) Rescisão por inadimplência: poderá ser efetivada pela Prestadora após 60 (sessenta) dias da suspensão total dos serviços.
(iii) Suspensão temporária a pedido do consumidor: direito de suspender o serviço, sem ônus, uma vez a cada 12 (doze) meses, por período de 30 (trinta) a 120 (cento e vinte) dias por ano. Durante a suspensão, não há cobrança e o Prazo de Permanência fica suspenso. O pedido deve ser atendido pela Prestadora em até 1 (um) dia.
(iv) Rescisão contratual a pedido do consumidor: pode ser solicitada pelo consumidor a qualquer tempo, por todos os canais de atendimento disponibilizados pela Prestadora, independentemente da existência de débitos.
Responsabilidade por Equipamentos
(art. 82, § 2º e § 3º)
A Prestadora, ou terceiro por ela autorizado, deverá providenciar a retirada dos equipamentos no prazo de 60 (sessenta) dias contados do pedido de rescisão, sem qualquer ônus ao consumidor. Após esse prazo, cessa a responsabilidade do consumidor pela guarda e integridade dos equipamentos, podendo este optar por realizar a entrega em local indicado pela Prestadora.
Obrigações das Prestadoras de Pequeno Porte (PPP)
(Título VIII, arts. 90 e 91)
O Novo RGC ampliou de forma significativa o rol de dispositivos aplicáveis às Prestadoras de Pequeno Porte (PPP). Embora ainda existam diferenciações regulatórias, grande parte das obrigações passou a ser estendida a essas Prestadoras, exigindo atenção redobrada aos processos de adequação.
O Novo Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC) promove uma revisão conceitual relevante, modernizando o regime contratual e ampliando a transparência na relação com o consumidor. A centralidade da Oferta e a padronização das informações contratuais são destaques importantes da nova disciplina.
Para as Prestadoras, a adequação ao Novo RGC demanda a revisão dos contratos, bem como de fluxos internos relacionados à fidelização, cobrança, inadimplência, suspensão e rescisão contratual.
A conformidade com o Novo RGC não representa apenas o cumprimento de uma obrigação regulatória, mas também um instrumento relevante de mitigação de riscos jurídicos e de profissionalização da relação com o consumidor.
Diante da complexidade das alterações e dos potenciais impactos regulatórios e jurídicos, recomenda-se que as Prestadoras contem com o apoio de profissionais qualificados e com atuação especializada no setor de telecomunicações, a fim de assegurar a correta adequação normativa, prevenir conflitos e evitar prejuízos.
Dra. Fabiana Molinero Marzano
Advogada e Consultora Jurídica na Silva Vitor, Faria & Ribeiro Advogados