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Artigos

Inconstitucionalidade da Dispensa do Pagamento de Honorários Sucumbenciais

By 26 de dezembro de 2025No Comments

Os honorários sucumbenciais, também denominados em alguns casos de honorários advocatícios, não se confundem com os honorários contratuais. Aqueles decorrem diretamente de processos judiciais e são arbitrados pelos magistrados, normalmente entre 10% e 20%, conforme o resultado da demanda. Compete ao julgador distribuir os ônus entre vencedores e vencidos, bem como definir a base de cálculo aplicável ao percentual fixado, seja o valor da condenação, o proveito econômico obtido ou o valor atribuído à causa.

O Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento recente da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.405, firmou entendimento acerca da inconstitucionalidade de normas que dispensavam o pagamento de honorários sucumbenciais em ações judiciais envolvendo a União, especialmente nos casos de adesão a parcelamentos ou celebração de acordos com o Poder Público. Reconheceu-se, assim, a violação ao direito dos advogados à percepção de sua remuneração devida.

A ADI nº 5.405, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB), questionou a constitucionalidade de diversos dispositivos de leis federais, dentre os quais:

  • Lei nº 11.775/2008, art. 8º, § 5º, que promoveu alterações relativas à responsabilidade pelo pagamento dos honorários sucumbenciais;
  • Lei nº 12.844/2013, art. 8º-B, inciso II, §§ 4º e 5º, e art. 9º, § 12, bem como a Lei nº 11.941/2009, art. 6º, § 1º, e a Lei nº 12.249/2010, art. 65, § 17, que preveem a dispensa da condenação em honorários em determinadas hipóteses, como nos casos de reconhecimento da procedência do pedido pela Fazenda Pública;
  • Lei nº 12.844/2013, art. 8º, § 21, e art. 10º, parágrafo único, que estabelecem que os honorários advocatícios seriam de responsabilidade de cada parte, dispondo ainda que o eventual inadimplemento não impediria a liquidação da dívida principal.

O CFOAB sustentou que tais dispositivos afrontavam o direito de propriedade e a dignidade da advocacia, ao suprimirem valores pertencentes aos advogados por direito próprio, comprometendo sua remuneração legítima.

Em defesa das normas impugnadas, a Presidência da República, o Senado Federal e a Advocacia-Geral da União (AGU) argumentaram que a responsabilidade pelo pagamento dos honorários sucumbenciais dependeria de decisão judicial, inexistindo direito adquirido antes do trânsito em julgado da sentença. Alegaram, ainda, que as leis apenas disciplinariam a responsabilidade pelo pagamento dos honorários, sem violação aos direitos da classe dos advogados.

Todavia, prevaleceu no STF o entendimento pela inconstitucionalidade dos dispositivos questionados. A Corte reconheceu que os honorários sucumbenciais possuem natureza alimentar e remuneratória, constituindo direito autônomo do advogado, que não pode ser suprimido sem sua anuência.

O relator da ação, Ministro Dias Toffoli, destacou que os honorários sucumbenciais exercem função essencial na valorização do trabalho da advocacia e na garantia de uma remuneração justa, por decorrerem diretamente da prestação de serviços jurídicos e serem indispensáveis à subsistência profissional. Ressaltou, ainda, que as normas impugnadas, ao tratarem da dispensa dos honorários de sucumbência, instituíram nova disciplina de direito processual, em afronta à vedação constitucional de edição de medida provisória sobre matéria processual, conforme o art. 62, § 1º, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal.

Assentou-se, ademais, que a isenção do pagamento dos honorários não pode ser imposta por normas infraconstitucionais sem o consentimento dos advogados, sob pena de violação à dignidade da profissão e ao direito de propriedade sobre valores que lhes são devidos.

O Ministro Flávio Dino, em voto parcialmente divergente, ponderou que a ausência de sentença judicial fixando os honorários sucumbenciais impediria a aplicação da jurisprudência consolidada do STF, que reconhece tais honorários como verba de natureza alimentar e remuneratória, integrante do patrimônio do advogado. Para o Ministro, o ordenamento jurídico não afastaria a validade de legislações voltadas à promoção da composição entre as partes, especialmente em acordos que desconsiderem ou transfiram a responsabilidade pelo pagamento de honorários ainda não fixados. Observou, nesse sentido, que dispositivos como o art. 6º, § 1º, da Lei nº 11.941/2009, e o art. 65, § 17, da Lei nº 12.249/2010, ao tratarem da dispensa dos honorários em caso de desistência da ação, não delimitam o momento processual da desistência, podendo ocorrer antes da fixação da verba. Concluiu, assim, que tais dispositivos somente seriam inconstitucionais se aplicados a processos nos quais os honorários já tivessem sido fixados em sentença, pois, na ausência de decisão judicial, haveria apenas expectativa de direito.

O julgamento da ADI nº 5.405 resultou, portanto, na declaração de inconstitucionalidade das normas que isentavam o pagamento de honorários advocatícios, reafirmando a proteção ao direito de propriedade dos advogados e assegurando o recebimento da remuneração devida em razão de sua atuação profissional. A decisão também ressalta a relevância dos honorários como instrumento essencial de valorização da advocacia e de proteção dos direitos dos profissionais da área.

Trata-se de julgamento emblemático, pois evidencia, inclusive, a impossibilidade de as partes, em sede de acordos judiciais, renunciarem a honorários sucumbenciais já fixados no processo, prática que, infelizmente, ainda se observa com frequência na rotina forense.

Ao reconhecer a violação a princípios constitucionais, o STF não apenas assegurou uma vitória significativa à advocacia, como também reforçou a dignidade da profissão e a justa remuneração pelos serviços prestados, reafirmando o compromisso da Corte com a integridade do sistema jurídico e com a efetiva tutela dos direitos fundamentais.

Dra. Ludmila Gurgel
Advogada e Consultora da Silva Vitor, Faria & Ribeiro | Sociedade de Advogados