Os honorários sucumbenciais, também denominados em alguns casos de honorários advocatícios, não se confundem com os honorários contratuais. Aqueles decorrem diretamente de processos judiciais e são arbitrados pelos magistrados, normalmente entre 10% e 20%, conforme o resultado da demanda. Compete ao julgador distribuir os ônus entre vencedores e vencidos, bem como definir a base de cálculo aplicável ao percentual fixado, seja o valor da condenação, o proveito econômico obtido ou o valor atribuído à causa.
O Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento recente da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.405, firmou entendimento acerca da inconstitucionalidade de normas que dispensavam o pagamento de honorários sucumbenciais em ações judiciais envolvendo a União, especialmente nos casos de adesão a parcelamentos ou celebração de acordos com o Poder Público. Reconheceu-se, assim, a violação ao direito dos advogados à percepção de sua remuneração devida.
A ADI nº 5.405, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB), questionou a constitucionalidade de diversos dispositivos de leis federais, dentre os quais:
- Lei nº 11.775/2008, art. 8º, § 5º, que promoveu alterações relativas à responsabilidade pelo pagamento dos honorários sucumbenciais;
- Lei nº 12.844/2013, art. 8º-B, inciso II, §§ 4º e 5º, e art. 9º, § 12, bem como a Lei nº 11.941/2009, art. 6º, § 1º, e a Lei nº 12.249/2010, art. 65, § 17, que preveem a dispensa da condenação em honorários em determinadas hipóteses, como nos casos de reconhecimento da procedência do pedido pela Fazenda Pública;
- Lei nº 12.844/2013, art. 8º, § 21, e art. 10º, parágrafo único, que estabelecem que os honorários advocatícios seriam de responsabilidade de cada parte, dispondo ainda que o eventual inadimplemento não impediria a liquidação da dívida principal.
O CFOAB sustentou que tais dispositivos afrontavam o direito de propriedade e a dignidade da advocacia, ao suprimirem valores pertencentes aos advogados por direito próprio, comprometendo sua remuneração legítima.
Em defesa das normas impugnadas, a Presidência da República, o Senado Federal e a Advocacia-Geral da União (AGU) argumentaram que a responsabilidade pelo pagamento dos honorários sucumbenciais dependeria de decisão judicial, inexistindo direito adquirido antes do trânsito em julgado da sentença. Alegaram, ainda, que as leis apenas disciplinariam a responsabilidade pelo pagamento dos honorários, sem violação aos direitos da classe dos advogados.
Todavia, prevaleceu no STF o entendimento pela inconstitucionalidade dos dispositivos questionados. A Corte reconheceu que os honorários sucumbenciais possuem natureza alimentar e remuneratória, constituindo direito autônomo do advogado, que não pode ser suprimido sem sua anuência.
O relator da ação, Ministro Dias Toffoli, destacou que os honorários sucumbenciais exercem função essencial na valorização do trabalho da advocacia e na garantia de uma remuneração justa, por decorrerem diretamente da prestação de serviços jurídicos e serem indispensáveis à subsistência profissional. Ressaltou, ainda, que as normas impugnadas, ao tratarem da dispensa dos honorários de sucumbência, instituíram nova disciplina de direito processual, em afronta à vedação constitucional de edição de medida provisória sobre matéria processual, conforme o art. 62, § 1º, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal.
Assentou-se, ademais, que a isenção do pagamento dos honorários não pode ser imposta por normas infraconstitucionais sem o consentimento dos advogados, sob pena de violação à dignidade da profissão e ao direito de propriedade sobre valores que lhes são devidos.
O Ministro Flávio Dino, em voto parcialmente divergente, ponderou que a ausência de sentença judicial fixando os honorários sucumbenciais impediria a aplicação da jurisprudência consolidada do STF, que reconhece tais honorários como verba de natureza alimentar e remuneratória, integrante do patrimônio do advogado. Para o Ministro, o ordenamento jurídico não afastaria a validade de legislações voltadas à promoção da composição entre as partes, especialmente em acordos que desconsiderem ou transfiram a responsabilidade pelo pagamento de honorários ainda não fixados. Observou, nesse sentido, que dispositivos como o art. 6º, § 1º, da Lei nº 11.941/2009, e o art. 65, § 17, da Lei nº 12.249/2010, ao tratarem da dispensa dos honorários em caso de desistência da ação, não delimitam o momento processual da desistência, podendo ocorrer antes da fixação da verba. Concluiu, assim, que tais dispositivos somente seriam inconstitucionais se aplicados a processos nos quais os honorários já tivessem sido fixados em sentença, pois, na ausência de decisão judicial, haveria apenas expectativa de direito.
O julgamento da ADI nº 5.405 resultou, portanto, na declaração de inconstitucionalidade das normas que isentavam o pagamento de honorários advocatícios, reafirmando a proteção ao direito de propriedade dos advogados e assegurando o recebimento da remuneração devida em razão de sua atuação profissional. A decisão também ressalta a relevância dos honorários como instrumento essencial de valorização da advocacia e de proteção dos direitos dos profissionais da área.
Trata-se de julgamento emblemático, pois evidencia, inclusive, a impossibilidade de as partes, em sede de acordos judiciais, renunciarem a honorários sucumbenciais já fixados no processo, prática que, infelizmente, ainda se observa com frequência na rotina forense.
Ao reconhecer a violação a princípios constitucionais, o STF não apenas assegurou uma vitória significativa à advocacia, como também reforçou a dignidade da profissão e a justa remuneração pelos serviços prestados, reafirmando o compromisso da Corte com a integridade do sistema jurídico e com a efetiva tutela dos direitos fundamentais.
Dra. Ludmila Gurgel
Advogada e Consultora da Silva Vitor, Faria & Ribeiro | Sociedade de Advogados