O setor de telecomunicações brasileiro está diante de uma das maiores transformações regulatórias desde a sua privatização. A Resolução nº 777, de 28 de abril de 2025, da Agência Nacional de Telecomunicações, que entrará efetivamente em vigor em outubro/2025, vai muito além de uma simples atualização normativa, pois representa um divisor de águas capaz de redefinir paradigmas e estabelecer novas bases para a atuação das empresas.
Ao revogar um expressivo conjunto de normas dispersas e instituir o novo Regulamento Geral dos Serviços de Telecomunicações (RGST), a ANATEL impõe um cenário de profundas mudanças. Essas mudanças requerem adaptações tecnológicas, operacionais e estratégicas de grande envergadura, demandando das prestadoras visão, agilidade e comprometimento com a excelência, que já vem sendo exigida diante da competitividade crescente no setor.
Para executivos, gestores regulatórios e profissionais do setor, compreender e antecipar essas transformações deixou de ser opção e tornou-se uma verdadeira questão de sobrevivência competitiva. As organizações que se posicionarem na vanguarda das adaptações sairão fortalecidas; já aquelas que vacilarem estarão expostas a elevados riscos regulatórios e à provável obsolescência operacional.
Entre as novidades mais impactantes da resolução em questão destaca-se o artigo 60, §2º, no tocante ao uso dos recursos de numeração, que determina, de forma categórica, a obrigatoriedade da autenticação de todas as chamadas telefônicas originadas nas redes das prestadoras.
Na prática, significa que sempre que uma chamada for originada utilizando números telefônicos convencionais, a prestadora deverá implementar mecanismos eficazes para autenticar a legitimidade dessa comunicação, combatendo fraudes, práticas de “spoofing” e chamadas de origem duvidosa.
Essa exigência se aplica tanto às chamadas originadas na própria rede da prestadora quanto àquelas provenientes de demais operadoras conectadas. É uma resposta assertiva à crescente preocupação com chamadas falsas, spam e fraudes, e exigirá das prestadoras investimentos robustos em soluções tecnológicas de autenticação, em integração de sistemas e em revisão de fluxos operacionais.
Notadamente, a obrigação vai além do universo interno: cada prestadora passa a ser corresponsável por autenticar chamadas oriundas de terceiros, blindando o sistema e eliminando potenciais portas de entrada exploráveis por agentes maliciosos. Com um prazo de até três anos para implementação, a demanda aponta para a necessidade de investimentos substanciais, evidenciando a necessidade de uma abordagem estratégica e centralizada.
Mais do que um mero cumprimento normativo, essa inovação regulatória representa uma oportunidade singular de diferenciação competitiva. As empresas que adotarem, de imediato, sistemas robustos de autenticação não apenas atenderão às exigências da ANATEL, mas também proporcionarão maior segurança jurídica e operacional aos seus clientes, fortalecendo a confiança e mitigando riscos de fraudes e chamadas indesejadas.
A revogação simultânea de múltiplas resoluções pela Resolução nº 777/2025 traz, ainda, uma simplificação normativa que, apesar de positiva, esconde desafios relevantes. As prestadoras precisarão revisitar processos internos, contratos, rotinas operacionais e práticas de compliance para garantir aderência integral ao novo marco regulatório.
Este movimento de consolidação, embora desafiador, abre espaço para modernização e otimização de processos empresariais, um passo à frente para aquelas companhias que buscam eficiência e sustentabilidade de longo prazo ou que há muito tempo vinham postergando a referida modernização.
Destaca-se também o impacto do artigo 315, que coloca fim à concessão de novas autorizações para o Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC). A medida reposiciona as atuais prestadoras e obriga uma profunda avaliação estratégica das empresas com maior dependência desse serviço tradicional.
No campo do compliance corporativo, reforçam-se ainda as obrigações relativas à segurança do trabalho, à demonstração de regularidade trabalhista e fiscal e à possível delegação de fiscalizações a entidades sindicais. Frentes que exigirão das empresas elevado grau de organização e transparência para evitar passivos e litígios.
A Resolução nº 777/2025 se destaca também por sua inovação regulatória ao instituir, de forma pioneira no ambiente regulatório de telecomunicações, oito princípios específicos para o uso de inteligência artificial no setor: confiabilidade, justiça, não discriminação, pluralidade, privacidade e proteção de dados, respeito aos direitos fundamentais e valores democráticos, sustentabilidade e transparência/explicabilidade.
Empresas que utilizem ou pretendam utilizar IA nas suas operações estão agora diante de requisitos claros que demandarão revisões técnicas, jurídicas e processuais.
Em perfeita harmonia com as tendências globais, as novas exigências de proteção de dados, que estabelecem premissas de retenção mínima, proteção adequada e exclusão após atingida a finalidade, alinham o setor às melhores práticas internacionais de privacidade e segurança dos dados pessoais.
A Resolução ANATEL nº 777/2025 é mais do que um avanço regulatório: representa a fundação de uma nova era para as telecomunicações nacionais. Os prazos de adaptação, que vão de 18 meses a três anos, exigem ação imediata e estratégica daqueles que desejam se manter não apenas em conformidade, mas em posição de liderança.
O protagonismo caberá às empresas que enxergarem nessas mudanças não um custo de compliance e sim uma oportunidade estratégica para fortalecer a governança, aprimorar processos e agregar valor aos produtos ofertados aos seus consumidores.
A reconstrução do setor está em curso. As prestadoras que se adaptarem com presteza não só assegurarão conformidade regulatória como ocuparão posições de destaque em um mercado cada vez mais competitivo, inovador e orientado ao consumidor.
Em síntese: o impacto dessas mudanças é inquestionável. A verdadeira questão é: sua organização está preparada para liderar essa transformação? O tempo de agir é agora. O futuro das telecomunicações já começou e pertencerá àquelas organizações que aliarem coragem à visão estratégica.
A revolução regulatória está posta: o seu protagonismo no setor dependerá das decisões que tomar hoje!
Gustavo de Melo Franco Tôrres e Gonçalves
Advogado e Consultor Jurídico
Sócio da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Sociedade de Advogados
gustavo@silvavitor.com.br
Catarina Paiva Andrade
Advogada e Consultora Jurídica
Sócia da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Sociedade de Advogados
catarina@silvavitor.com.br