O setor de telecomunicações no Brasil vive um ciclo intenso de consolidação. O aumento das operações de fusões e aquisições (M&A) é impulsionado pela necessidade de ampliar redes, incorporar inovação tecnológica e fortalecer a competitividade em um mercado cada vez mais exigente.
Nessas transações, o sucesso não depende apenas do valor financeiro envolvido, mas principalmente da organização empresarial das partes. Uma estrutura sólida e bem administrada garante segurança jurídica, transparência e credibilidade, fatores indispensáveis em um ambiente regulado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
Estrutura organizacional: o alicerce de uma negociação bem-sucedida:
Antes de iniciar tratativas para a venda, aquisição de ativos ou participações societárias, é essencial que a empresa esteja preparada internamente, com processos formalizados, gestão contábil rigorosa e conformidade regulatória junto à Anatel.
Uma empresa organizada transmite confiança. Quando as informações são consistentes e auditáveis, investidores têm maior segurança para avaliar o negócio, o que contribui para um valuation mais elevado e reduz riscos de passivos ocultos, trabalhistas, fiscais, ambientais ou jurídicos.
No setor de telecomunicações, a regularidade de licenças e autorizações, bem como a boa gestão de contratos com parceiros estratégicos, preservam o valor do ativo e fortalecem a reputação empresarial, impactando diretamente o sucesso da operação.
Governança, Compliance e Acordo de Sócios: a Base Jurídica das Operações de M&A
Uma estrutura empresarial sólida exige governança, compliance e instrumentos jurídicos adequados, que assegurem previsibilidade e proteção em operações complexas.
O Compliance vai além do cumprimento de normas: representa credibilidade e sustentabilidade institucional. Políticas de integridade (Lei nº 12.846/2013), auditorias internas e comitês de ética fortalecem a confiança de investidores e órgãos reguladores, criando um ambiente favorável à expansão organizada.
A governança societária, por sua vez, se concretiza em instrumentos contratuais que regulam as relações entre os sócios e orientam decisões estratégicas. Nesse contexto, o Acordo de Sócios é essencial.
Mais do que formalidade, ele define regras sobre entrada e saída de sócios, distribuição de lucros, voto, solução de conflitos e operações de M&A. Sem essas regras, divergências podem inviabilizar transações e gerar insegurança jurídica.
Para mitigar riscos e equilibrar interesses, destacam-se cláusulas como:
- Direito de Preferência – garante prioridade aos sócios na aquisição de quotas, evitando a entrada de terceiros indesejados;
- Direito de Primeira Oferta (Right of First Offer) – assegura que o sócio vendedor ofereça sua participação inicialmente aos demais sócios;
- Drag Along (direito de arraste) – permite ao sócio majoritário obrigar minoritários a venderem nas mesmas condições, viabilizando a operação;
- Tag Along (direito de acompanhamento) – protege o minoritário, garantindo-lhe o direito de vender nas mesmas condições ofertadas ao majoritário
Esses mecanismos asseguram alinhamento, previsibilidade e fluidez nas decisões estratégicas, prevenindo impasses e valorizando a empresa perante investidores.
Aportes de Sócios: Reflexos Tributários e Importância da Formalização
A constituição das sociedades empresárias se inicia com a integralização do capital social pelos sócios, por meio de aportes financeiros, bens ou direitos. Contudo, ao longo do tempo, é comum que esses mesmos sócios realizem novos aportes na empresa, com o objetivo de fortalecer o fluxo de caixa, financiar expansões ou suportar investimentos operacionais, mas nem sempre tais aportes são formalizados como aumento de capital social.
Essa prática recorrente, embora comum, pode gerar efeitos significativos do ponto de vista contábil e tributário. Como o capital social registrado serve de base para o cálculo do custo de aquisição das participações societárias, aportes não formalizados impactam diretamente o cálculo do ganho de capital (GCAP) em eventuais operações de compra e venda de quotas ou ações.
Na prática, isso significa que, se os aportes adicionais realizados ao longo dos anos não tiverem sido integralizados formalmente no capital social, o valor declarado de custo de aquisição das participações permanecerá reduzido. Assim, no momento da alienação, o ganho de capital apurado pela Receita Federal será maior, resultando em uma tributação mais elevada para os sócios vendedores.
Por outro lado, quando há adequada formalização dos aportes via aumento de capital social, o valor contábil das quotas é atualizado, refletindo o investimento real dos sócios e reduzindo o impacto tributário no cálculo do GCAP.
Portanto, a manutenção de uma contabilidade societária organizada e a assessoria jurídica permanente são fundamentais para garantir que os aportes sejam corretamente registrados e que as operações futuras de M&A reflitam de forma fidedigna o valor econômico investido. Esse cuidado preventivo se soma às práticas de governança e planejamento societário, contribuindo para operações mais seguras, transparentes e financeiramente otimizadas.
Aspectos Jurídicos e Contratuais: Planejamento e Segurança
Além da governança e da estrutura societária, a base jurídica e contratual é o eixo de sustentação de qualquer operação de M&A.
O apoio de uma assessoria jurídica especializada garante que todas as etapas, da negociação à integração pós-transação, ocorram com segurança e eficiência. Entre as medidas essenciais, destacam-se:
- Contratos detalhados, com cláusulas de garantias, indenizações, responsabilidades e não concorrência;
- Planejamento societário e fiscal que otimize tributos, estrutura de controle e sucessão empresarial;
- Identificação e mitigação de passivos trabalhistas, fiscais, ambientais e regulatórios;
- Mecanismos de governança e resolução de disputas, preferencialmente via arbitragem, que assegurem agilidade e confidencialidade.
Essas ações asseguram que o negócio não apenas se conclua, mas gere sinergias reais e sustentáveis, maximizando o valor estratégico da operação.
Casos práticos: lições do mercado
Exemplos recentes reforçam a importância da organização e do suporte jurídico no setor de telecomunicações.
Em 2025, a Brasil TecPar adquiriu 55% da AllRede, ampliando sua presença em quatro estados e atingindo cerca de 1,3 milhão de acessos. O sucesso da operação resultou de análise de ativos, revisão contratual e verificação regulatória criteriosas.
De forma semelhante, a aquisição da Blink, com 150 mil clientes em Minas Gerais, consolidou a estratégia de expansão do grupo com sinergias operacionais e tecnológicas.
Esses casos demonstram que organização, compliance e planejamento jurídico são diferenciais competitivos nas operações de M&A no setor.
Como se vê, a organização empresarial é o eixo central para o sucesso de operações de compra e venda no mercado de provedores de telecomunicações. Ela não apenas viabiliza a transação, mas agrega valor econômico, reduz riscos e fortalece a confiança entre as partes.
A adoção de boas práticas de governança, compliance e acordos de sócios bem estruturados, alinhadas à legislação vigente e à regulação da Anatel, é essencial para assegurar o crescimento sustentável e a competitividade das empresas.
Um escritório jurídico especializado em M&A desempenha papel determinante nesse processo, atuando desde a estruturação administrativa e regulatória até a integração pós-negócio, garantindo que cada operação se converta em um passo sólido de expansão e consolidação no mercado de telecomunicações.
André Martins
Sócio, Advogado e Consultor Jurídico
Silva Vitor, Faria & Ribeiro | Sociedade de Advogados