Ao longo de anos de trabalho no mercado de ISPs e telecomunicações, a Silva Vitor, Faria & Ribeiro Advogados realizou consultoria jurídica e tributária em centenas de ISPs e operadoras de telecomunicações (em todas as partes do Brasil), bem como já defendeu inúmeras autuações fiscais realizadas por Municípios, Estados e pela Receita Federal (União), tendo se deparado com diversas situações de elevado risco fiscal, relacionadas à organização tributária de um ISP.
Dentre elas, gostaríamos de destacar, sinteticamente, os seguintes equívocos:
- Fixação de um percentual irrisório para o SCM: ao longo de todos esses anos, uma das nossas principais preocupações nas consultorias prestadas foi se estabelecer, em cada empresa, um percentual sustentável do SCM, ou seja, se demonstrar contabilmente que as receitas de SCM auferidas pelo ISP suportam os custos atrelados ao SCM. Tudo isso aliado a uma organização correta da empresa em centro de custos.
Por outro lado, já nos deparamos com diversas empresas que optam por estabelecer um percentual irrisório ao SCM. E nesses casos, para demonstrar que a atividade “SCM” é superavitária, optam por retirar da empresa responsável pelo SCM diversos custos e investimentos diretamente atrelados a essa atividade, deslocando os mesmos para outras empresas (muitas vezes, para empresas com outras finalidades, como, por exemplo, faturamento de Serviços de Valor Adicionado – SVAs).
O que, ao final, acaba criando um cenário de risco fiscal, haja vista a completa distorção de custos, investimentos e receitas entre as empresas do mesmo grupo.
- Inclusão de SVAS sem correspondência contratual:Já nos deparamos com diversas situações de empresas que optaram pela estratégia tributária de inclusão de Serviços de Valor Adicionado (SVAs) nas Ofertas Conjuntas (COMBOS), mas se esqueceram de refletir essa estratégia tributária nos Contratos com os assinantes, nas faturas, nas ofertas, anúncios e sites.
É fundamental, para um planejamento tributário seguro juridicamente, que toda inclusão de SVAs na Oferta Conjunta (COMBO) seja devidamente refletida não apenas nas notas fiscais, mas em toda a parte documental do ISP, sobretudo nas faturas, contratos, ofertas, anúncios e sites. Inclusive, com contratos padrões devidamente registrados em cartório, e disponíveis para consulta pelo assinante no site do ISP.
Além disso, importante analisar o SVA a ser incluído como estratégia tributária, haja vista a enorme variação de carga tributária entre os mais diversos SVAs disponíveis no mercado. Esa preocupação se acentuará com a Reforma Tributária, uma vez que alguns SVAs, após a implementação da Reforma Tributária, terão carga tributária equivalente ao SCM (no tocante ao IBS e CBS).
- Migração de estratégia tributária sem formalização perante o assinante: Outra prática usual do mercado é a alteração da estratégia tributária pelos ISPs, ou a alteração de algum SVA que compõe a estratégia tributária, ou alteração do valor atinente ao SCM e/ou aos SVAS, sem a necessária formalização perante os assinantes que contrataram o ISP anteriormente a essa alteração (e que estão sendo impactados por essa alteração).
Importante, nesse tocante, sempre formalizar perante o assinante todas as alterações efetuadas em relação a planos ou ofertas conjuntas (COMBOS) já contratados. De modo que o contrato do assinante sempre fique devidamente atualizado aos serviços efetivamente disponibilizados, bem como à estratégia tributária do ISP.
- Locação de ONU ou ONT: Outro equívoco usual que se nota no mercado de ISPs é a opção por incluir como estratégia tributária a locação de ONU ou ONT, como um dos SVAs que compõem a oferta conjunta (COMBO). E nesse prisma, considerando que a ONU ou ONT é fundamental para se estabelecer a conexão primária com o assinante, o Fisco sustenta usualmente a impossibilidade de se cobrar pela locação deste tipo de equipamento.
O que reforça o risco desta estratégia tributária, e demonstra a necessidade de o ISP substituir esta locação por outro tipo de SVA (mantendo o equipamento meramente em comodato), especialmente porque já existem no mercado SVAs de melhor carga tributária, se comparado à locação de equipamentos.
- Utilização de Convênios (Regimes Especiais): Há no ordenamento jurídico, atualmente, alguns Convênios (Regimes Especiais), que visam reduzir a base de cálculo (ou alíquota) do ICMS incidente sobre os serviços de telecomunicações, mas com algumas exigências e contrapartidas muito claras, sejam previstas no próprio Convênio, sejam previstas na regulamentação de cada Estado que aderiu ao Convênio.
É o caso, por exemplo, do Convênio ICMS 19/2018, que tem os seguintes Estados como signatários: Acre, Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia, Sergipe e Tocantins.
Este Convênio específico, a título de exemplificação, apesar de possibilitar uma redução de até 75% (setenta e cinco por cento) na base de cálculo do ICMS, estabeleceu diversas exigências para que os ISPs possam usufruir desse benefício fiscal, sendo que uma delas é a vedação a qualquer tipo de separação entre SCM e SVAs, conforme se nota na regulamentação feita pela maioria dos Estados.
Apesar disso, alguns ISPs têm aplicado a redução prevista neste Convênio e, ao mesmo tempo, mantido a estratégia tributária de inclusão de SVAs na Oferta Conjunta (COMBO), o que representa um risco tributário elevado.
- Múltiplas empresas, faturamento intragrupo e ausência de finalidade própria: nesses anos de trabalho, nos deparamos com situações de grupos que optaram pela estratégia de múltiplas empresas (ou seja, organizar suas atividades em mais de 01 empresa, do mesmo grupo econômico), mas com um erro muito evidente, a título de exemplificação: uma empresa sendo utilizada para gerar despesas para outra empresa do mesmo grupo (faturamento intragrupo), sem propósito negocial claro e específico.
Outro exemplo de erro evidente nessa estratégia de múltiplas empresas, já identificado no mercado de ISPs, é a criação de uma empresa específica para concentrar a folha de pagamento do grupo, também sem um propósito negocial claro e específico.
Nesse tocante, ao se estabelecer um planejamento tributário que envolva mais de 01 (uma) empresa, é fundamental, na nossa visão, se criar um propósito negocial e finalidade própria para cada empresa. Além disso, cada empresa deve possuir sua autonomia negocial, administrativa e financeira.
O faturamento intragrupo, portanto, apresenta risco fiscal, sobretudo quando a empresa responsável pelo faturamento não detiver receita própria advinda diretamente dos clientes (assinantes), o que demonstra uma dependência financeira entre as empresas envolvidas.
- Grupo Econômico e o Simples Nacional: uma ocorrência natural no mercado de ISPs é se iniciar a operação no Simples Nacional e, com o passar dos anos e o crescimento da empresa, muitos ISPs optam erroneamente por prolongar o enquadramento no Simples Nacional, através da criação de outra(s) empresa(s) em nome de interposta(s) pessoa(s).
Acerca deste tema, importante destacar que o Fisco, atualmente, tem se mostrado bastante atuante em fiscalizações envolvendo grupo econômico e o Simples Nacional, possuindo a seu alcance vários meios de prova aptos a demonstrar os elos de conexão entre as empresas (e os elos de conexão entre seus sócios). Tudo isso para, ao final, justificar a exclusão retroativa do Simples Nacional sob o argumento de prática de simulação e constituição de empresa(s) por interposta(s) pessoa(s).
Ademais, crucial ainda ressaltar que, com um planejamento tributário adequado e uma boa estratégia fiscal, um ISP pode obter, fora do Simples Nacional, uma carga tributária similar ou até melhor que ele possui no Simples Nacional (sobretudo se já estiver próximo a atingir o sublimite de R$ 3.600.000,00/ano, ou se já tiver superado esse sublimite). O que reforça a necessidade de o ISP buscar uma consultoria tributária, ao contrário de optar por estratégias tributárias de alto risco fiscal.
- Sonegação Fiscal: outra prática que também já observamos no mercado é a omissão de receitas (não emissão de documento fiscal), prática esta que pode ser facilmente identificada pelo Fisco, sobretudo se a receita omitida possuir lastro bancário, ou seja, se o recebimento (efeito caixa) decorrente desta receita ocorrer através de conta corrente vinculada ao ISP.
Sob esse prisma, fundamental destacar que, atualmente, o Fisco possui a seu alcance diversos mecanismos aptos a apurar a omissão de receitas, como o acesso aos extratos bancários do ISP, cruzamento com os relatórios emitidos pelas administradoras de cartão de crédito, e ainda, o acesso aos arquivos do Convênio 115/2003, demonstrando, portanto, que este tipo de prática é facilmente identificável pelo Fisco.
Nos deparamos também, ainda sob a ótica de sonegação fiscal, com empresas que optaram pela emissão de nota fiscal apenas em relação aos clientes adimplentes, ou seja, emissão de nota fiscal tão somente após o recebimento da mensalidade de cada assinante. O que, por sua vez, constitui outra prática errônea, haja vista que os documentos fiscais devem ser emitidos independentemente do recebimento ou não dos valores devidos por cada assinante.
Esses são, em síntese, os principais problemas que já nos deparamos no mercado de ISPs e telecomunicações. E sob essa ótica, é de extrema importância que cada ISP realize uma análise da sua organização tributária e contábil, no intuito de eliminar contingências e estar melhor preparado para futuras e eventuais fiscalizações.
Sendo que, para tal, uma consultoria tributária, com experiência no mercado, é de suma importância.
Paulo Henrique da Silva Vitor
Sócio fundador da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Advogados
Advogado e Consultor Jurídico