Em 16 de agosto de 2022, o STJ julgou o REsp 1.746.268/SP (2018/0137032-6), cujo cerne da discussão travava da possibilidade ou não de as empresas do Lucro Real incluírem, a título de despesas/custos dedutíveis, os pagamentos efetuados a sócios, diretores ou administradores, incluindo conselheiros fiscais e consultivos, independentemente se tais pagamentos são fixos ou eventuais.
Discutia-se no referido processo a legalidade do art. 31 da IN n.° 93/1997, que trata da apuração do IRPJ e da CSLL e impede as deduções de pagamentos quando não correspondem à remuneração mensal fixa por prestação de serviço. Vejamos:
Art. 31. São dedutíveis na determinação do lucro real, sem qualquer limitação, as retiradas dos sócios, diretores ou administradores, titular de empresa individual e conselheiros fiscais e consultivos, desde que escriturados em custos ou despesas operacionais e correspondam a remuneração mensal e fixa por prestação de serviços.
Grosso modo, com fundamento no art. 31 da IN n.° 93/1997, o Fisco somente permitia a dedução no Lucro Real dos valores correspondentes à remuneração fixa mensal, vedando, por exemplo, a dedução de honorários pagos a administradores de forma eventual, de modo que a base de cálculo do IRPJ e da CSLL e, consequentemente, a carga tributária, eram majoradas.
Ocorre que o próprio o STJ já possuía o entendimento de que atos administrativos normativos, tal como a IN n.° 93/1997, não podem criar óbices à dedutibilidade de despesas no regime do Lucro Real, matéria que deve ser objeto de lei.
Reforçando este entendimento, a Ministra Relatora Regina Helena Costa, no mencionado REsp 1.746.268/SP (2018/0137032-6), afirmou em seu voto revelar-se “inaceitável restringir, mediante ato administrativo (IN SRFB n. 93/1997), a legítima dedutibilidade da apontada despesa com a remuneração pela prestação de serviços de administradores e conselheiros”, confirmando a ilegalidade material da norma na qual o Fisco se apoiava.
Além disso, a Ministra Relatora destacou o entendimento firmado pela 3ª Turma do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF no julgamento do processo n. 18471.001569/2006-13 (Acórdão n. 1301-000.729), segundo o qual “a dedução de despesas com administradores ou diretores não se limita à remuneração fixa mensal”, uma vez que “inexiste a limitação de dedutibilidade das despesas com remuneração de administradores ou diretores”.
Dessa forma, por intermédio da referida decisão, foi decidido pelo Excelso STJ que ao impedir a dedução no Lucro Real de pagamentos eventuais, o Fisco estaria instituindo a cobrança de imposto fundamentada em uma norma infralegal (Instrução Normativa), o que não é admissível, haja vista que este impedimento deveria ter amparo em Lei.
E para além da referida ilegalidade material, é fundamental registrar que a legislação determina que o IRPJ incida sobre valores que representem um acréscimo patrimonial às pessoas jurídicas, o que não é o caso dos valores pagos ao sócios, administradores e conselheiros. Ora, tais valores representam claro decréscimo patrimonial, independentemente se constituírem uma remuneração fixa ou eventual.
Logo, os pagamentos eventuais efetuados a sócios, diretores e administradores não podem ser classificados de outra forma, senão como custos/despesas passíveis de serem deduzidas para fins de se verificar o Lucro Real da empresa em determinado exercício financeiro.
Ademais, tendo em vista que os valores recebidos pelos sócios, administradores e conselheiros já são objeto de tributação pelo IRPF, ao vedar sua dedução como custos/despesas das pessoas jurídicas, o Fisco cria uma hipótese em que um mesmo montante é tributado tanto pelo IRPJ quanto pelo IRPF. Ou seja, nítido exemplo de bitributação.
Portanto, a decisão proferida pelo STJ surge como um importante entendimento favorável ao contribuinte na busca pela dedução dos valores pagos aos sócios, diretores ou administradores, independentemente se fixos ou eventuais.
É importante destacar que esta decisão não foi proferida no rito de recursos repetitivos e tampouco encontra-se pacificada no CARF, mas trata-se de um forte precedente que permitirá a discussão judicial de valores a serem deduzidos como custos/despesas pelas empresas optantes pelo Lucro real, com a consequente a restituição de deduções não realizadas nos últimos 5 (cinco) anos.
Guilherme Augusto Nunes Almas de Moura
Advogado
Integrante da Consultoria Tributária da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Sociedade de Advogados